segunda-feira, 21 de junho de 2010

JE SUIS UN SOIR D'ÉTÉ



Brel retrata na perfeição a esclerose que acompanha o aburguesamento da alma e do corpo. Em Je suis un soir d’été, revisitamos uma cidade da província - neste caso, nas margens do Meuse - entorpecida no meio dos campos, longe do mar e dos portos, vivendo devagar, sufocante de tanta pasmaceira. Mas lá não faltam os seus notáveis que organizam festas pirosas, com os seus divertimentos medíocres, com muita bebida, muita comida, muitas saias, adultérios, mexericos, etc. Brel considerava esta uma das suas melhores canções. Chamo a atenção para o ambiente criado com a orquestração e com a dolência da interpretação. É uma noite quente de Verão, não há dúvida !

Eu sou uma noite de Verão (1968)

E a Sub-Prefeitura festeja a sua Sub-Prefeita, sob um candelabro cheio de pingentes reluzentes...
Chovem laranjadas, espumantes mornos e comentários frios das fêmeas enfadonhas dos funcionarizados...
Eu sou uma noite de Verão...

Nas janelas abertas os comensais do costume empurram os pratos e dizem que está calor...
Os homens lançam arrotos de cavaleiros teutónicos e as toalhas caem em migalhas sobre as varandas...
Eu sou uma noite de Verão...

Nos terraços confusos alguns beberrões transpirados falam de pilecas e de velhas pérfidas...
É a hora em que os suspensórios seguram o presente dos transeuntes dispersos e dos bêbados...
Eu sou uma noite de Verão...

Apaixonadas de peso, com cheiro a cozinha, passeiam a peitaça pelas margens do Meuse...
Falta-lhes um soldado para que o Verão se regabofe e suba, haja o que houver, até às suas partes baixas...
Eu sou uma noite de Verão...

Nas fontes, os velhos enrolados em recomendações, regressam à sua infância com passinhos chuvosos...
Riem-se com um só dente para trincar o silêncio que rodeia as raparigas que dançam a morte de uma Primavera... Eu sou uma noite de Verão...

O calor envertebra-se e desaguam bebedeiras... O Verão tem as suas missas cantadas e é à noite que as celebra... A cidade, aos quatro ventos, pestaneja o remorso inútil e passageiro, por não ser um porto...
Eu sou uma noite de Verão...


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