Na canção CES GENS-LÁ tudo é sombrio e frio (até a sopa). Excepto Frida, a rapariga jovem, que é bela como um sol e que ama a vida. Mas toda a família se opõe à intromissão do amor no seu seio… Repare-se na orquestração que acentua a gravidade e a rigidez desta família… e da situação criada por um intruso.
ESSA GENTE
Em primeiro lugar está o mais velho, aquele que parece um melão, que tem um nariz grande, aquele que já nem o seu nome sabe... Ó homem, o que ele bebe… E o que ele bebeu, de tal modo que não faz nada com aqueles dez dedos... Mas ele, que já não pode com ele, que está completamente despachado, e que se toma pelo rei... que todas as noites se encharca em carrascão mas, mas que na manhã seguinte, lá está na igreja adormecida, teso que nem um barrote, branco como um círio de Páscoa. Depois balbucia com um olhar vago...
É preciso dizer, meus senhores, que em casa desta gente não se pensa, meus senhores, não se pensa... Reza-se...
E depois há o outro... Aquele que tem cenouras nos cabelos e que jamais viu um pente... Aquele que é mau como a sarna, mesmo que dê a camisa a um pobre. Aquele que casou com a Denise, uma rapariga da cidade, quer dizer, de uma outra cidade, e que ainda não está xexé... Tem os seus pequenos negócios... Tem um chapelinho, tem um casaquinho, tem o seu carrinho... Gosta muito de dar ares, mas não tem ar de coisa nenhuma... Não se pode brincar aos ricos quando não se tem um tostão na algibeira...
É preciso dizer, meus senhores, que em casa desta gente não se vive, meus senhores, não se vive... Intruja-se...
E depois, há os outros... A mãe que não diz nada, e mesmo que diga não importa... Sempre presente, debaixo da sua cara de apóstolo, fechado na sua moldura de madeira, está o bigode do pai que morreu de uma escorregadela. Agora observa o seu rebanho a empanturrar-se de sopa fria e a fazer grandes chhhhhluuup... a fazer grandes chhhhhhluuuup...
E também está lá aquela muito velhinha, que não pára de estremecer, e todos esperam que rebente visto que é ela que tem uns patacos... Mas ninguém liga nenhuma ao que aquelas pobres mãos contam...
É preciso dizer, meus senhores, que em casa desta gente, não se conversa, meus senhores, não se conversa... Fazem-se contas...
E depois, e depois há a Frida, que é bela como o sol, e que me ama tanto como eu a amo a ela... Dizemos muitas vezes que havemos de ter uma casa com montes de janelas, e quase sem paredes, e que havemos de lá viver... Será tão bom lá viver... Bem, se isto não é certo, pelo menos, é quase certo. Porque os outros não querem, os outros não querem... Os outros dizem que ela é demasiado linda para mim e que eu só sirvo para esfolar gatos... Eu nunca matei gatos, ou então, se foi, foi há muito tempo, ou então já me esqueci, ou eles cheiravam mal... Enfim, eles não querem... Estão contra.
Às vezes, quando nos encontramos, fingindo que é por acaso, com os olhos molhados ela diz que partirá, e que me seguirá... Então, por um instante, por um instante somente, eu acredito nela, meus senhores, por um instante, um instante somente...
Porque de casa desta gente, meus senhores, ninguém sai, ninguém sai...
Mas está a fazer-se tarde, senhores, são horas de eu regressar a minha casa...
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
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O mais trágico nesta canção, e eu acho que é um aspecto que passa algo despercebido, não é tanto que o protagonista nunca ficará com a rapariga, como ele próprio sabe, mas o facto de ele vir de uma casa e de uma família tal e qual como a que descreve.
ResponderEliminarMuito bom trabalho esta recolha e tradução. Parabéns e obrigado.
ResponderEliminarlindo trabalho!
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