domingo, 1 de novembro de 2009

LES REMPARTS DE VARSOVIE



Jacques Brel canta em público as suas canções pela última vez em 1967. Desiste dos palcos, com 38 anos de idade, porque não quer envelhecer artisticamente perante o seu público. O público reage mal a esta reforma antecipada do cantor. Ele dirá “que não é preciso exagerar, os artistas de variedades não são deuses”, e acrescenta que não passa “de um artesão, de um fabricante de canções”… A canção Les remparts de varsovie, pertence ao seu último disco gravado em 1977.

AS MURALHAS DE VARSÓVIA(1977)

A madame passeia o traseiro pelas muralhas de Varsóvia... A madame passeia o coração pelos trastes da sua leviandade... A madame passeia a sua sombra pelas grandes praças de Itália... Eu acho que a madame vive a sua vida! A madame passeia de madrugada os sinais das suas insónias... Passeia a cavalo os seus estado de alma e os seus caprichos... Passeia um imbecil que jura que a madame é linda... Eu acho que a madame está bem servida!
Ao passo que eu, todas as noites, sou porteiro no Alcazar...

A madame passeia o Verão até ao Sul da França... A madame passeia os seios até ao Sul do acaso... Passeia a depressão ao longo do lago de Constance... Eu acho que a madame é de circunstância!
A madame passeia o seu Lulu, um salsicha negro, chamado Bizâncio... A madame arrasta a sua infância, que altera conforme as ocasiões... A madame passeia por todo o lado o seu sotaque russo, com facilidade... A verdade é que a madame é de Valence...
Ao passo que eu, todas as noites, sou barman no Alcazar...

A madame passeia os cabelos que têm um perfume de “Noites da China”... A madame passeia o olhar sobre todos os velhos industriais... Passeia o seu sorriso, como outros passeiam a sua brilhantina.... Eu acho que a madame é uma libertina! A madame passeia as suas bebedeiras de copo em copo, de taça em taça... Passeia os genes de vinte mil oficiais de Marinha... A madame diz por todo o lado que é conhecida por Titi Jacqueline... Eu acho que a madame é uma má companhia!
Ao passo que eu, todas as noites, sou cantora ligeira no Alcazar...

A madame passeia as mãos pelos diferentes ramos das forças armadas... Passeia os meus tostões pelos novos ricos do bairro da lata... A madame passeia-se de coche e gostava que fosse eu a puxá-lo... Eu acho que a madame é uma vaidosa... A madame passeia o pé de meia que ela gostava que fosse eu a administrar... A madame passeia as jóias que ela gostava que fosse eu a pagar... A madame passeia no meu Rolls e persegue alguns meirinhos... Eu acho que a madame está é com pressa...
Ao passo que eu, todas as noites, lavo a loiça no Alcazar!


Versão de FLORENT PAGNY

sábado, 31 de outubro de 2009

LEILÃO NA SOTHEBY'S (2008)


LEILÃO NA SOTHEBY'S

Faz agora um ano que, em Paris, a famosa Empresa londrina Sotheby's pôs a leilão uma colecção de 95 artigos pessoais de Jacques Brel que renderam um total de 1 026 989 euros, mais do dobro do estimado. A maior parte das licitações foram telefónicas.
Em leilão estavam guitarras, discos, filmes, posters, cartazes, cadernos manuscritos e documentos relacionados com o hobby da aviação: Licenças de voo, brevets e mapas aéreos.
Um dos itens mais esperados era um pequeno bloco com a primeira versão de Amsterdam, escrita com uma BIC, e que foi vendido por 108 750 euros.
Segundo a Sotheby's este foi o maior leilão de sempre que aquela casa fez de um artista francófono só comparável ao leilão de artigos dos Beatles em Londres.
Antes do leilão os objectos a vender estiveram expostos na Bélgica e na Holanda.
Todos estes artigos perteciam a uma das namoradas do cantor e que a Sotheby's não quis identificar.
A família do cantor, que possui os direitos sobre o trabalho do artista, tentou no passado comprar todo o arquivo mas sem resultado. Em 2003 conseguiu mesmo adiar um primeiro leilão, através de uma providência cautelar, mas a família da antiga namorada, que entretanto já morreu, voltou à carga. A viúva de Jacques Brel classificou este leilão de “vergonhoso” por entender que todos aqueles artigos eram património familiar.
O leilão de Sotheby's foi feito exactamente no 30º aniversário da morte do autor de Ne me quitte pas: 9 de Outubro de 2008.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

JACQUES BREL IS ALIVE AND WELL AND LIVING IN PARIS

JACQUES BREL ESTÁ VIVO E BEM DE SAÚDE E VIVE EM PARIS

Este é o título de um espectáculo musical produzido por ERIC BLAU, estreado a 22 de Janeiro de 1968 no THE VILLAGE GATE THEATER (New York) onde esteve mais de 4 anos em cena. Nele participavam apenas 4 cantores: Shawn Elliot, Alice Whitefield, Elly Stone (mulher do produtor) e um cantor e compositor americano que ficou célebre nos anos 60 por ter composto diversos êxitos para a música pop, e de onde se destaca o famoso LE LAC MAJEUR, interpretado por si mesmo: MORT SHUMAN.
O espectáculo consistia na dramatização de 25 canções de Brel traduzidas para inglês por Blau e Shuman e houve muito americano que pensou tratar-se de um produto cem por cento americano e que Jacques Brel era uma personagem imaginária…
Este Musical dedicado a Brel celebrou o seu 5º aniversário no Carnegie Hall com um espectáculo, agora intitulado “Homenagem a BREL” e onde participavam 22 artistas.
Jacques Brel esteve presente nesta homenagem.
Em 1974 o espectáculo original foi reposto no Astor Place Theater.
Em 1988 voltou à cena para celebrar o 20ºaniversário no Town Hall em Manhattan e no Kennedy Center , Washington, DC, e em 1995 foi feita outra reposição em Londres.
Em 2006 “JACQUES BREL ESTÁ VIVO E BEM DE SAÚDE E VIVE EM PARIS” volta a Nova Iorque onde foi reposto em cena no Zipper Theater .
Fora dos Estados Unidos este musical foi apresentado no Canadá (1968), África do Sul (1970), e posteriormente em Sidney, Paris, Dublin, Amesterdão e Copenhaga.
Entretanto, vários discos e vídeos já foram feitos destas versões do musical.

Let's look at the trailer...

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

AMANDA McBROOM



Do meu amigo EDUARDO CARQUEIJEIRO recebi esta informação sobre Brel que passo a publicar.

A cantora AMANDA McBROOM gravou um disco só com canções de Jacques Brel intitulado CHANSON.
Uma notícia sobre este disco e sobre a cantora foi publicada ontem no NEW YORK TIMES sob o título "Canções cuja letra são uma questão de vida ou de morte".

terça-feira, 27 de outubro de 2009

LE TANGO FUNÈBRE

Além de François Rauber, Jacques Brel teve outro colaborador fundamental para a sua carreira. Foi o pianista Gérard Jouannest. Com Brel compôs umas quarenta canções. Jouannest soube sempre agarrar o texto que Brel escrevia e dar-lhe a melodia certa. O texto publicado hoje, Le tango Funèbre, tem música de Gérard Jouannest, um pianista de formação clássica, que abandonou os concertos onde tocava Beethoven, Liszt e Ravel, para se dedicar inteiramente à canção ligeira de um só cantor: Jacques Brel.

O TANGO FÚNEBRE (1964)

Ahh... Já estou a vê-los a cobrirem-me de beijos e a disputarem as minhas mãos, e a perguntarem muito baixinho “Será que já morreu?”...”Será que já não morre?... “Será que ainda está quente? “... “Será que já está frio ?”. E depois abrem-me os armários e acariciam as faianças. Revistam as gavetas, e ávidos, procuram as minhas cartas de amor, atadinhas aos pares, que irão depois ler à lareira, rindo às gargalhadas...

Ahh... Já estou a vê-los, formais e friorentos, armados em artistas seguindo o meu sobretudo de madeira... Eles espevitam o coração para serem os mais tristes... Eles espetam os cotovelos para serem os primeiros... Trouxeram umas velhotas que não me conheciam, trouxeram uns garotos que nunca me conheceram... Eles pensam no preço das flores e acham indecente não se morrer só na Primavera, quando toda a gente gosta de lilases*...


Ahh... Já estou a vê-los, os meus queridos falsos amigos, sorridentes sob o peso do dever cumprido... Ah, já estou a ver-te, tão triste e tão aliviada, escondendo debaixo dum véu essas lágrimas de crocodilo... Tu nem sequer percebeste que ao sair do meu cemitério, vais entrar no teu inferno, quando já levas pelo braço, o braço do teu novo amparo, do teu novo aconchego, que te fará chorar muito mais do que eu...

Ahh... Já me estou ver, arrumado para sempre, muito triste, muito frio, no meu jardim das tabuletas... Ah, já me estou a ver a chegar ao fim da tal viagem que não tem regresso... Estou a ver tudo isto, e ainda há quem tenha a lata de me mandar beber só água, de não me atirar às raparigas, de fazer o meu pé-de-meia, de comer só filetes de cavala e de gritar viva o rei !!!**


(*Na Primavera os lilases são mais baratos; **A Bélgica é uma monarquia)

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

L'ÉCLUSIER

O tédio, o aborrecimento, o fastio, são temas de algumas canções brelianas. O suicídio aparece então como o remédio possível para o tédio, já que à volta nada muda. A rotina não traz surpresas, não espanta. O hábito não faz esquecer a miséria dos dias sempre iguais. Nesta canção, L’éclusier, Brel retrata a vida do guarda da comporta que vê passar todos os dias, ao longo do ano, os mesmos barqueiros nos mesmos barcos, com as mesmas piadas, com os mesmos gestos…

O GUARDA DA COMPORTA (1968)

Os barqueiros vêem-me envelhecer e eu vejo envelhecer os barqueiros. Brincamos ao jogo dos tolos, onde o mais parado é o mais velho... Na minha profissão, mesmo no Verão, só de olhos fechados podemos viajar... Não custa nada ser guarda de comporta...

Os barqueiros conhecem bem a minha carantonha... Eles gozam-me mas sem razão. Meio bruxo, meio bêbado, lanço uma praga a todos os que cantam... Na minha profissão é no Outono que se colhem as maçãs e os afogados. Não custa nada ser guarda de comporta...

Com o seu cabaz, chega um miúdo vesgo por olhar para a mosca que tem poisada no nariz... A mãe ronrona, o tempo suspira, a couve transpira e o fogo crepita... Na minha profissão é no Inverno que se pensa no pai que morreu afogado... Não custa nada ser guarda de comporta...

E na Primavera os barqueiros fazem-me macaquices das suas lanchas... Talvez entrasse nestas brincadeiras, mas, sem as ofensas que me deixam desgostoso... Na minha profissão é na Primavera que a gente tem tempo para se afogar...


Neste vídeo Jacques Brel canta em casa de um amigo, o pintor Paul George Klein, acompanhado unicamente por um acordeão.
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domingo, 25 de outubro de 2009

MON PÈRE DISAIT

Os espectáculos de Jacques Brel tinham a duração de aproximadamente uma hora. Entre as canções Brel interrompia os aplausos do público para iniciar a canção seguinte. Não havia explicações, conversas, anedotas, comentários para entreter, falsas intimidades com o público – fraquinho tão comum de muitas estrelas da cena internacional. Quando Brel apresentava os músicos, o público já sabia que a próxima canção seria a última canção do espectáculo. Depois, não havia falsas saídas, não havia “encores”… Para justificar esta atitude, Brel dizia “ já alguma vez viram um actor de teatro regressar ao palco para repetir uma cena ou um acto da peça que esteve a representar?”

O MEU PAI DIZIA (1967)

O meu pai dizia “É o vento do Norte que faz rachar os diques em Scheveningen, em Scheveningen, rapaz... É tão forte que já ninguém sabe quem navega, se o mar do Norte, se os diques... É o vento do Norte que trespassa os olhos dos homens do norte, velhos ou novos, para fazer cantar as catadupas de azul vindas do norte para o fundo dos seus olhos...”

O meu pai dizia “É o vento do Norte que faz girar a Terra à volta de Bruges, à volta de Bruges, rapaz... É o vento do Norte que tem torneado a Terra em torno das torres de Bruges e que faz com que as nossas raparigas tenham esse olhar tranquilo de velhas cidades... Que faz com que as nossas beldades tenham o cabelo tão frágil como as nossas rendas... Como as nossas rendas”…

O meu dizia “ É o vento do Norte que faz estalar a Terra entre a Bélgica, rapaz, entre a Bélgica e a Inglaterra... E Londres já não é como antes do dilúvio, o lugar de Bruges... Tirando o mar, Londres não é mais que os arredores de Bruges perdidos no mar... Perdidos no mar”…

O meu pai dizia “ É o vento do Norte que levará para a terra o meu corpo sem alma e sem raiva... É o vento do Norte que levará para a terra o meu corpo sem alma em frente ao mar... É o vento do Norte que me fará Capitão de um quebra-mar ou de uma baleia... É o vento do Norte que me fará Capitão de um quebra-lágrimas, para aqueles que eu amo...”