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segunda-feira, 4 de junho de 2012

JEAN DE BRUGES - O FURACÃO


O Furacão é 3ª e última parte do poema sinfónico JEAN DE BRUGES escrito e dramatizado por Jacques Brel e com música sinfónica de FRANÇOIS RAUBER. Encontra-se AQUI no youtube.
Neste poema o velho marinheiro fanfarrão Jean de  Bruges conta que “enfrentou o maior furacão do mundo. Uma coisa medonha. Nunca vista. Foi de tal maneira que destruiu a costa norte da Bélgica, onde se encontra Bruges, dividindo a terra para formar os arredores de Bruges que tomaram então o nome de  Inglaterra.
No mesmo disco, que se intitulou “Jacques Brel chante la Belgique”, (edição Barclay)
estava ainda a canção “Il neige sur Liège”.
Este é, portanto, um disco raríssimo. Um disco que deve valer uns milhares de euros. Se o encontrarem por aí nalguma feira, nalgum alfarrabista, avisem por favor.




A mim,  Jean de Bruges
Grande  contramestre da "Coquette"
Trinta anos de mar e de tempestades
A mim, Jean de Bruges
A mim, tu ofereces-me um copo, loiro e cheínho
Tu ofereces-me um copo de cerveja espumosa
E eu conto-te um furacão
O mais terrível furacão
Que fez tremer a terra
Então ofereces-me esse  copo?

Jean de Bruges, eis o teu copo
Jean de Bruges, eis a tua cerveja
O lúpulo vai dar-te o entusiasmo
E tu poderás melhor meter-nos medo…

Credo, credo, era um furacão
Primeiro o vento, um vento perverso
Muito quente, muito pesado, muito cinza, muito forte,
Um vento terrível como a morte,
E depois a chuva, a chuva
Que  vem, que vai,
Que agride, que morde, que bate,
Uma chuva real de Golgota

Adeus meu Bruges
Adeus meu Brugense
Tenho medo, rezo, choro, tenho frio
Acreditei que ia morrer desta vez
Cheguei mais alto que uma nuvem.

E mais negra do que um pecado, mais longa que uma viagem
Uma onda construída de pedra e de aço 
A todo o vapor avançou como o animal ferido.
De repente, ela levantou-se sobre as ondas de trás
A cabeça no céu e os pés no inferno
E, em seguida, caindo a onda quebrou tudo.
As montanhas desapareceram, os oceanos nasceram
E ela fez uma ilha,
Ao cair em terra
Neste subúrbio de Bruges
A que chamamos Inglaterra.

Jean de Bruges, o teu furacão
Vai  contá-lo a Ghent
Burguês, transeunte, padre, vigário,
Poeta, comerciante, soldado, notário,
Se não queres que eles te devorem,
É melhor pagar, pagar para beber,
Antes da história que depois da história
De Jean de Bruges.

domingo, 3 de junho de 2012

JEAN DE BRUGES - A SEREIA


O segundo poema para o poema sinfónico de François Rauber chama-se A SEREIA, que tal como o de ontem terá transcrição em português e versão original, cantada pelo próprio BREL, e que se encontra no youtube AQUI.
Em 1956, Brel e Rauber encontram-se pela primeira vez e este encontro trouxe uma mudança radical no estilo de Brel em cima do palco. Brel cantava agarrado à sua viola tirando-lhe todas as hipóteses de se expressar a não ser pela voz. Rauber começou a orquestrar as canções que Brel escrevia e convenceu-o a libertar-se da viola… E assim nasceu um novo Brel. Com toda a sua teatralidade corporal em acção. A canção passou a ser uma peça de teatro com 3 minutos. As mãos, os braços, os dedos, os gestos, os olhares, passaram a dar vida aos bêbados, aos tímidos, aos velhos, aos militares,  e tantos, tantos outros.
A colaboração entre os dois artistas durou até ao último disco de Jacques, Les Marquises, lançado em 1977. 



Grande  contramestre da "Coquette"
Trinta anos de mar e de tempestades
A mim, Jean de Bruges
A mim, Jean de Bruges
Tu ofereces-me um copo, loiro e cheínho
Tu ofereces-me um copo de cerveja espumosa
E eu conto-te os meus amores
Sim, eles eram os mais estranhos da terra
Então ofereces-me esse  copo?

 Jean de Bruges, eis o teu copo
Jean de Bruges, eis a tua cerveja
O lúpulo vai dar-te o sentimento
E tu poderás chorar mais facilmente…

Era uma sereia estranha,
Era uma sereia estranha,
Metade sereia e metade anjo,
E já fazia um longo tempo de tempo,
Muito tempo de tempo, muito tempo de vento
Que a ouvíamos cantar à noite
E eu chorava como hoje
Deus, Deus, sob a lua, como ele era linda,
O mar era a sua renda
Ela chamava-me, ela chamava-me,
Ela amava-me como eu a amava
Uma noite, uma noite, cansado de ser Irmã Arme,
Uma noite de lânguido oceano,
Eu uni-me a ela na esquina de uma vaga
Ao longe adormecia Copenhaga.


sábado, 2 de junho de 2012

JEAN DE BRUGES - A BALEIA



Em 1963 o orquestrador de Jacques Brel, FRANÇOIS RAUBER (1933/2003), que tinha formação clássica em piano, pediu a Brel um poema que ele pudesse orquestrar para concorrer a um concurso da Academia Francesa. Brel escreveu 3 poemas baseados numa figura mítica belga chamada JEAN DE BRUGES.  Um velho marinheiro que a troco de uma cerveja contava aventuras  fantásticas que tinha vivido por esses mares e oceanos.
Hoje vou transcrever o primeiro dos poemas sinfónicos traduzido para português – A BALEIA – e transferir do YOUTUBE a versão original da canção veio de um disco de Brel que nunca esteve à venda. Foram feitas umas dezenas de cópias para oferecer numa festa relacionada com velhos marinheiros belgas.





A mim, a mim,  Jean de Bruges
Grande  contramestre da "Coquette"
Trinta anos de mar e de tempestades
A mim, Jean de Bruges
A mim, tu ofereces-me um copo, loiro e cheínho
Tu ofereces-me um copo de cerveja espumosa
E eu conto-te já
A minha pesca com um cachalote
Que era sem dúvida o maior da terra
Então ofereces-me esse  copo?

Jean de Bruges, aqui está o teu copo
Jean de Bruges, aqui está a tua cerveja
O lúpulo vai-te fazer falar
E tu mentirás mais facilmente…

Era uma baleia enorme
Era uma baleia enorme
Comprida como um canal de chuva
Grande  como uma cervejaria
Com olhos como sóis
Como nunca viste parecidos
Era uma baleia enorme, enorme

Na  "Coquette" todo a gente rezava
Esta baleia é o fim do mundo
Gritava, gritava no mastro da proa
Gritava, gritava o capitão
Mas é o inferno e o seu demónio
Gritou, gritou o marujo
Mas eu , mas eu
Sem medo no extremo da ponte
Com minhas facas e arpões,
Eu saltei-lhe sobre as costas
Feri-o, matei-o
Acabou-se o cachalote
Ele sangrou, sangrou,
Mas não o pudemos trazer
Foi no Mar do Oriente
Nem mais uma única baleia lá se move
E este mar,  é o Mar Vermelho.

Ah Jean de Bruges,
Esta baleia, mataste-a  para nós cem vezes
Ah Jean de Bruges,
Esta baleia, ela é tanto nossa quanto tua.


quinta-feira, 8 de julho de 2010

SUR LA PLACE



Esta canção teve três versões. Em 1953, em Bruxelas, depois em 1954 com arranjos de André Gassi e finalmente em 1961 com a orquestra de François Rauber. Sur la place foi editada num EP (45 rpm) e precedeu uma digressão de Verão organizada por Canetti.
No cartaz desta digressão o nome de Brel figurava depois dos nomes de Sidney Bechet, Philippe Clay et Dario Moreno que, 14 anos depois seria o Sancho Pança em Bruxelas, ao lado de um Brel-Don Quixote que já não combatia os moinhos do anonimato.
Quando questionavam Brel sobre os seus textos, se eram poesia ou simples versos cantáveis, ele dizia que não era poeta. Era um artesão de palavras. Ele estava constantemente a inventar-se nos velhos solitários, no moribundo, no tipo que dizia Ne me quitte pas, no bêbado que se chamava Jef. Era como se Brel tivesse uma ilha e lá fizesse crescer as plantas, os pássaros, os homens… Ou a rapariga que dançava no largo num dia de muito calor. Sur la place, conta a história dessa rapariga.

No largo (1953)

No largo aquecido pelo sol uma rapariga pôs-se a dançar... Rodopia, parecendo a bailarina duma antiga caixa de música... Na cidade faz um calor tórrido. Homens e mulheres, estão acaçapados e observam pelas vidraças esta rapariga que dança ao meio-dia...
Há certos dias que parecem uma labareda nos nossos olhos...
À igreja onde eu ia, recorria-se ao bom Deus, os apaixonados recorrem ao amor, o mendigo apela à caridade, o dia apela ao sol e o homem de bem apela à bondade...

No largo quente, de atmosfera vibrante, onde nem sequer aparece um cão, ondulante como um junco, a rapariga saltita, e vai e vem. Nem guitarra, nem tamborim, para acompanhar a sua dança... É batendo as palmas que ela marca o compasso...

No largo, onde tudo está tranquilo, a rapariga pôs-se a cantar, e o seu canto paira sobre a cidade como um hino de amor e de bondade... Mas, sobre a cidade faz muito calor, e para não ouvir a canção os homens fecham as janelas, como uma porta que se fecha entre os mortos e os vivos...

Assim, certos dias parecem um labareda nos nossos corações…
Mas nós nunca deixamos brilhar a sua luz...
Nós tapamos as orelhas e cobrimos os olhos...
Não gostamos de acordar o nosso coração já velho...

No largo um cão uiva ainda, porque a rapariga já se foi embora… E, como um cão uivando à morte, lastimam os homens o seu destino...


terça-feira, 1 de junho de 2010

HEUREUX



Esta canção está no segundo LP gravado por Brel em 1957. Teve uma tiragem de 10.000 exemplares. Um número bastante ousado para a época e dez vezes superior ao do primeiro disco. Devido a este sucesso, em Junho desse ano, Jacques Brel é um dos premiados do Grand Prix du Disque de l'Académie Charles Cros.

Feliz (1957)

Feliz o que canta para a criança e que, sem nada lhe dizer, a guia pelo caminho triunfante. Feliz aquele que canta para a criança... Feliz aquele que chora de alegria por enfim se ter dado por amor, ou por um beijo que se bebe. Feliz aquele que chora de alegria...

Felizes os amantes separados e que não sabem ainda que amanhã se vão reencontrar. Felizes os amantes separados...Felizes os amantes extasiados cuja força dos vinte anos não serve para mais nada senão para se amarem. Felizes os amantes extasiados...

Felizes os amantes que nós somos e que amanhã, longe um do outro, se amarão, se amarão, acima de todos os homens...


Em Novembro de 1957 conhece o pianista Gérard Jouannest e logo a seguir François Rauber. Rauber passará a dirigir a orquestra que acompanhará Brel no palco e em digressão.
Esta pequena observação serve apenas para nos apercebermos da grande diferença que vai desta orquestração pirosa de Heureux (1957) para as orquestrações pujantes feitas por François Rauber nos anos seguintes.

sábado, 8 de maio de 2010

TITINE




A canção TITINE gravada por Jacques Brel em 1964 é uma adaptação de uma velha canção de 1917 (de Mauban e Bertal) mas que só ficou conhecida em 1936 quando Charlie Chaplin a usou no filme TEMPOS MODERNOS.
Originalmente no texto desta canção o seu autor limitava-se a “procurar a Titine que nunca mais encontrava”. Porém, Brel, bem ao seu estilo, deu a volta ao texto. E meteu-lhe os condimentos necessários para ficar uma canção breliana. Depois de muito procurar a Titine ao volante do seu Hispano, ele finalmente encontrou a sua amada, mas ela tinha mais que fazer do que ficar em casa a aturá-lo. Aturá-lo a ele, ao cão e aos doze filhos... e partiu. Foi ver um filme do Charlot.
O arranjo orquestral de François Rauber ajuda a construir esta cena a preto e branco, cujo protagonista é a figura trágico-cómica do marido traído que procura desesperadamente a mulher.

Titine (1964)

Encontrei a Titine, oh Titine, minha Titine que eu não encontrava! Encontrei-a por acaso a vender mata-borrão atrás de uma montra na Gare Saint Lazare. Disse-lhe, Titine, minha Titine, porque me deixaste? Porque partiste assim, sem um gesto, sem uma palavra? Foste ver um filme do Charlot ao Cinema Olympia. Já há trinta anos que te procurávamos por todo o lado, o meu Hispano e eu, gritando como loucos, atrás de ti, Titine...

Mas agora encontrei a Titine! A minha Titine que eu não encontrava... Procurei-a por todo o lado, do Gabão a Tonquim… Procurei-a em vão, do Chile ao Peru. E disse-lhe Titine, minha Titine, suplico-te, volta! Eu sei que mudaste, estás um pouco menos provocante, pois caminhas como o Charlot, e falas pelos cotovelos, mas enfim, é melhor que nada, quando se vive trinta anos, sozinho com um cão e doze filhos que andaram atrás de ti, Titine.... Titine, oh, minha Titine!

Mas agora encontrei a Titine! A minha Titine que eu não encontrava! Gostava que a vissem... Ela é toda em ouro, bem melhor que a Valentina, bem melhor que a Eleanora. Mas ontem quando lhe disse, Titine, minha Titine, será que ainda me amas? ela foi-se embora outra vez, assim, sem um gesto, sem uma palavra, foi ver um filme do Charlot ao cinema Olympia... E pronto, lá estamos nós, a procurá-la por todo o lado, o meu Hispano e eu, gritando como loucos, atrás da Titine... Titine, Oh, minha Titine !!!
E nós encontraremos a Titine, a minha Titine, e tudo se vai arranjar.


terça-feira, 23 de março de 2010

BREL REALIZADOR (2)



LE FAR WEST

Realização: Jacques Brel
Argumento: Jacques Brel
Imagem: Alain Levent
Música: Jacques Brel et François Rauber
Montagem: Jacqueline Thiédot
Produção: IFC Films, Films 13
Duração: 85 min.
Estreia: 15/05/1973
Com: Jacques Brel, Gabriel Jabbour, Danielle Evenou, Arlette Lindon, et des amis de Jacques Brel.

Jacques, um « Bruxellois » quarentão, encontra um dia o faquir Abracadabra que, antes de morrer, lhe transmite uma energia única com efeitos que Jacques desconhece. Num acaso da vida, ele vai encontrar um garimpeiro, Gabriel, personagem generoso, vestido como Davy Crockett, que irá segui-lo sem fazer perguntas. Os dois companheiros, seguidos por outros, partem à conquista do Far West da sua infância, como Voltaire procurou o El Dorado e Saint-Exupéry procurou o planeta desconhecido.
Porque o Far West é em lado nenhum: é uma parcela imaginária como todo o mundo gosta de sonhar, um pedaço de felicidade escondido no coração ...

domingo, 21 de março de 2010

BREL REALIZADOR (1)



FRANZ
Realização: Jacques Brel
Argumento: Jacques Brel e Paul Andréota
Música: Jacques Brel et François Rauber
Montagem: Jacqueline Thiédot
Produção: Belles Rives-Cinevog
Duração: 90 min.
Estreia: 02/02/1972
Com: Jacques Brel, Barbara, Danièle Evenou, Fernand Fabre, Serge Sauvions, Louis Navarre, Jacques Provins, François Cadet.

SINOPSE
Leonie e Catherine chegam a uma casa de saúde para funcionários em Blankenberge. Enquanto que uma é bastante reservada, a outra tem um caráter verdadeiramente bizarro, atraindo a virilade de todos os homens. Uma só excepção, Léon, que intriga a personalidade secreta de Léonie. Ele corteja-a desajeitadamente e ela deixa-se levar pelo comportamento deste solitário inábil. Os outros pensionistas, divertindo-se com o romance, arquitectam uma encenação estranha.

Neste video Barbara canta a canção de Brel "Sur la place" ilustrada por imagens de FRANZ:

sábado, 13 de fevereiro de 2010

AMSTERDAM

AMSTERDAM , talvez a canção mais famosa de Jacques Brel, depois de Ne me quittes pas, foi gravada uma única vez em 1954, numa noite de Outubro. No Olympia de Paris. E porquê? Porque ele não gostava da canção.
Anos mais tarde o seu amigo e orquestrador François Rauber explicou as razões que levavam Brel a não gostar da canção. Especialmente não lhe agradava a tautologia dos primeiros versos da primeira estrofe “Dans le port d’Amsterdam y a des marins qui chantent, les rêves qui les hantent, au large d’Amsterdam” ou então o exagero “et ils pissent comme je pleure, sur les femmes infidèles”. Também a forma da canção, em quatro estrofes sem refrão, que lhe parecia um pouco primária.
Por outro lado, AMSTERDAM estava marcada por uma espécie de pecado original que é ter sido uma canção sem a menor importância. Brel decidiu então que no seu regresso ao Olympia ela seria a canção de abertura do concerto. Quem está dentro deste mundo do espectáculo sabe que a canção de abertura é uma canção sacrificada: O técnico de som aproveita para acertar os volumes, os músicos aproveitam para “se fazer ao instrumento” e sobretudo o público VÊ mais do que OUVE o cantor, na primeira canção. “Desta maneira, vai passar despercebida” terá dito Brel.
Contrariamente aos outros artistas da época, que reservavam as suas novas canções para estrear em Paris, Brel lança as suas não importa onde, não importa quando, desde que estejam prontas. Como dava mais de 200 concertos por ano, com direito apenas a algumas semanas de férias, era em digressãoque ele escrevia, ou no camarim ou no quarto do hotel. Nos ensaios, antes dum especáculo, aproveitava para compor a música. No palco com o seu pianista Gérard Jouannest ou às vezes com o acordeonista Jean Corti , ele dizia “toca-me aí uma marcha... toca-me aí um tango canalha...” e ele cantava o que tinha nuns rascunhos, às vezes apenas umas linhas. Quando saía uma pequena linha melódica dizia “já está, isto está a desabrochar”. Começavam então a trabalhar a canção. No ensaio do espectáculo seguinte recomeçavam. Brel escrevia mais estrofes. Apurava-se a melodia. Reescreviam-se outras estrofes e um dia quando ele achava que estava tudo pronto, dizia “Pessoal, esta já está. Esta noite vamos lançá-la”.
AMSTERDAM foi composta desta maneira e ficou pronta imediatamente antes do espectáculo do Olympia. Nunca foi feita uma gravação em estúdio.
(Adaptação de um texto da autoria de Compagnie Brel Trente ans déjà)

Amesterdão (1964)

No Porto de Amesterdão há marinheiros que cantam os sonhos que os atormentam ao largo de Amesterdão, há marinheiros que dormem como estandartes ao longo de muralhas sombrias. No Porto de Amesterdão há marinheiros que morrem às primeiras luzes do dia, cheios de cerveja e de dramas, e há marinheiros que nascem no calor espesso dos langores do oceano.

No Porto de Amesterdão há marinheiros que comem caldeiradas de peixe, sobre toalhas muito brancas. Exibem dentes prontos a despedaçar fortunas, capazes de abocanhar a lua e estraçalhar enxárcias. E sente-se o cheiro a bacalhau até dentro das batatas fritas que as suas mãos grandes não se cansam de pedir. Depois levantam-se, rindo numa grande algazarra, apertam as braguilhas e saem arrotando...

No Porto de Amesterdão há marinheiros que dançam esfregando a pança na pança das mulheres. E giram, e dançam, como sóis escarrados ao som dilacerado de um acordeão rançoso, e torcem o pescoço para melhor se ouvirem rir, até que de repente o acordeão se cala, e então, com um gesto grave e com um olhar altivo, eles invocam os seus antepassados, já em plena luz do dia...

No Porto de Amesterdão há marinheiros que bebem, e que bebem, e tornam a beber, e que bebem mais uma vez. Bebem à saúde das putas de Amesterdão, de Hamburgo, e doutros portos, por esse mundo... Enfim, bebem à saúde das mulheres que lhes oferecem os seus corpos lindos, que lhes oferecem a sua virtude por uma moeda de ouro. E quando estão bem bebidos, empinam o nariz, assoam-se nas estrelas, e mijam, como eu choro, sobre as mulheres infiéis. No Porto de Amesterdão...


sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

MADELEINE



Para Brel o contacto directo em palco, com os seus músicos era imprescidível. Ele lamentava os artistas do play-back dizendo que eles se deixavam vender como os dentífricos. Jacques Brel, no estúdio de gravação, juntamente com a orquestra, fazia duas ou três gravações, não mais. Por fim ia para a cabina de som e com o seu maestro Rauber e com o seu pianista Jouannest escolhiam a melhor gravação.
Jacques Brel foi dos poucos cantores que teve a honra de ser aplaudido pelos músicos da orquestra, durante as gravações. Que se saiba só Sarah Vaughan teve também este privilégio.

MADALENA (1961)
Esta noite espero a Madalena. Trouxe uns lilases, aliás, todas as semanas trago lilases... Ela gosta tanto... Tomaremos o eléctrico trinta e três para ir comer umas batatas fritas ao Eugénio, ela gosta tanto... A Madalena é o meu Natal, a minha América, mesmo que seja boa de demais para mim, como diz o primo Joel... Mas, esta noite, espero a Madalena, iremos ao cinema e direi muitas vezes que a amo… Ela gosta tanto... Ela é tão bonita, ela é... Ela é... Tudo isso... Ela é toda a minha vida, a Madalena, que eu espero...

Esta noite espero a Madalena, mas, já chove sobre os meus lilases... Chove como todas as semanas e a Madalena que não chega! Já é tarde para o eléctrico trinta e três... Já é tarde para as batatas fritas do Eugénio, e a Madalena que não chega... Ela é o meu horizonte, é a minha América, mesmo que seja boa demais para mim, como diz o seu primo Gastão... Mas, esta noite espero a Madalena e só me resta o cinema... Vou dizer-lhe muitas vezes que a amo! Ela gosta tanto... Ela é toda a minha vida, a Madalena, que nunca mais chega...

Esta noite esperava a Madalena, mas já deitei fora os lilases, aliás, deito-os fora todas as semanas... A Madalena não virá... O cinema já se foi e eu fico-me com os meus “amo-te, amo-te”... A Madalena já não virá... Ela é a minha esperança, a minha América, e certamente que ela é boa demais para mim, como diz o seu primo Gaspar... Esta noite esperava a Madalena, e olha, o último eléctrico já partiu e o Eugénio deve estar a fechar... Ela já não vem... A Madalena que nunca mais chega...

Mas, amanhã, amanhã esperarei a Madalena... Trarei os meus lilases. Todas as semanas trago lilases. Ela gosta tanto... Vamos apanhar o eléctrico trinta e três para comer umas batatas fritas no Eugénio... Ela vai gostar tanto... A Madalena é a minha esperança, a minha América. Não me importa que ela seja boa demais para mim, como diz o seu primo Gaspar... Amanhã esperarei a Madalena, iremos ao cinema e eu vou dizer-lhe muitas vezes que a amo... Ela vai gostar tanto...



sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Brel actor (4)

LA BANDE À BONNOT ou Les Anarchistes

Realização: Philippe Fourastié
Argumento: Rémo Forlani, Philippe Fourastié
Imagem: Alain Levent
Música: François Rauber et Jacques Brel
Montagem: Jacqueline Thiédot
Produção: Intermondia, Kinésis, Mega Films
Duração: 110 min. Estreado: 30/10/1968
Com: Jacques Brel, Annie Girardot, Bruno Cremer.
Argumento :
Um grupo de anarquistas franceses decide entrar pelos caminhos da luta armada quando o seu chefe Raymond (Jacques Brel) é capturado. Juntam-se a um famoso gangster, Bonnot (Bruno Cremer), roubam um carro e começam a assaltar Bancos. E os pacíficos anarquistas rapidamente se tornam perigosos criminosos depois de matar pessoas e fugirem para a Bélgica. Escondem-se num bordel até que a dona os denuncia. O grupo separa-se mas os seus elementos sentem-se inseguros sem o lider Bonnot. A polícia local prende um elemento do bando e logo de seguida cerca o resto dos elementos e pede a ajuda do exército para quenhum consiga escapar. Este filme de gangsters passa-se no princípio do século XX e foi inspirado em factos relatados no Petit Journal.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

L'AIR DE LA BÊTISE

Jacques Brel grava o seu terceiro disco em 1957. É um disco ainda influenciado por temas muito líricos, de matriz moralista. Há, porém, neste trabalho uma canção que deixa antever um Brel NOVO. Um Brel que pretende dizer coisas diferentes. Nesta canção, L’air de la Bêtise, o cantor deixa-se de lirismos e revela-se duro, ríspido, crítico. A agressividade e a provocação manifestam-se...

A ÁRIA DA ESTUPIDEZ (1957)

Mãe das pessoas sem preocupações. Mãe dos que se dizem poderosos... Mãe dos brandos costumes e princesa das gentes sem remorsos... Nós te saudamos, Dona Estupidez, tu que tens um reino desconhecido... Nós te saudamos, Dona Estupidez,...
Mas, diz-me lá, qual é o teu segredo para teres tantos amantes e tantos namorados, tantos representantes e tantos prisioneiros... Para urdires tantos malentendidos, e fazer crer aos cretinos que afinal nós somos persuadidos a vencer na vida à custa de falsos respeitos... De invejas mesquinhas... De nobres intolerâncias...

Mãe das mulheres fatais e dos casamentos por dinheiro... Mãe de todas as meretrizes... Princesa pálida do Vison, nós te saudamos, Dona Estupidez... tu que tens um reino desconhecido... Nós te saudamos, Dona Estupidez...
Mas, diz-me lá, qual é o teu segredo para que a gente não veja o sorriso cúmplice que fará de nós todos, cornudos muito nobres... Para nos fazer esquecer que as verdadeiras putas são aquelas que se fazem pagar, não antes, mas depois... Para que seja possível, certas noites, eu cruzar-me com o teu olhar familiar no fundo do meu espelho...


segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

OS NOMES DE PARIS

Segundo as próprias palavras de Brel, para se vencer na vida do espectáculo musical só havia uma cidade: PARIS. Em Fevereiro de 1953 ele tinha gravado em Bruxelas um disco com duas canções que vendeu duzentos exemplares. Desiludido comprou um bilhete de 3ª classe para a cidade luz. Quando saiu o primeiro disco de Brel, em França, um crítico de um prestigiado jornal parisiense escreveu “este belga cantor não se esqueça que há dois comboios por dia para Bruxelas…”
Brel não se deixou abater pelas críticas e Paris foi realmente o seu grande trampolim para a fama.

OS NOMES DE PARIS(1961)
O sol nasce e acaricia os telhados e é PARIS DIA... O Sena passeia-se e faz-se meu guia e é PARIS SEMPRE. O meu coração pára sobre o teu que sorri e é PARIS BOM DIA! A tua mão na minha mão diz-me que sim, e é PARIS AMOR... O primeiro encontro na Ilha de São Luís e é PARIS QUE COMEÇA... O primeiro beijo roubado nas Tulherias e é PARIS DESEJO... E o primeiro beijo recebido sob um alpendre e é PARIS ROMANCE e duas cabeças estonteadas ao olhar Versailles e é PARIS FRANÇA!

Os dias que esquecemos esquecem-se de nós e é PARIS ESPERANÇA... As horas em que os nossos olhares são apenas um olhar e é PARIS ESPELHO. Há sempre mais noites a separar as nossas canções e é PARIS BOA NOITE... E chega, enfim, o dia em que já não dizes NÃO e é PARIS ESTA NOITE! Um quarto tristonho onde termina a nossa viagem e é PARIS NÓS DOIS... Um olhar que recebe toda a ternura do mundo e é PARIS TEUS OLHOS... Essa jura que é mais chorada que falada e é PARIS SE TU QUISERES, sabendo que amanhã será como foi hoje e é PARIS FELICIDADE...

Mas chega o fim da viagem, chega o fim da canção e é PARIS CINZENTO, último dia, última hora, primeira lágrima também, e é PARIS CHUVA... Esses jardins já sem graça, que perderam todo o encanto e é PARIS TÉDIO, a gare onde se vai cumprir a última ruptura e é PARIS DESFECHO... Longe dos olhos, longe do coração, escorraçado do Paraíso e é PARIS TRISTEZA... Mas, uma carta tua, uma carta que diz sim, e é PARIS AMANHÃ... As vilas e as cidades, as estradas tremem de entusiasmo e é PARIS A CAMINHO! E tu estás lá à minha espera, e tudo vai recomeçar, e é PARIS ESTOU DE VOLTA!!!


sábado, 5 de dezembro de 2009

BREL e o TEMPLO DO SOL

Quando se fala na Bélgica e na sua cultura moderna três nomes surgem imediatamente:
George Simenon, o Escritor, criador do Inspector Maigret.
Hergé, o autor de BD criador do Tintim.
Jacques Brel, o Cantor e autor de algumas das melhores canções da língua francesa.
Qualquer deles levou o nome da Bélgica aos 4 cantos do mundo. Todos os três têm a sua obra traduzida em inúmeras línguas e venderam milhões de exemplares dos seus trabalhos.
Em 1969 Brel colaborou com Hergé fazendo duas canções para o filme O TEMPLO DO SOL. Esta aventura em BD tinha sido publicada em álbum alguns anos antes.
Quarenta anos depois presto esta pequena homenagem aos dois belgas divulgando aqui o texto de ODE À NOITE do filme de animação Temple du Soleil.
A melodia é da autoria de François Rauber.
(Uma curiosidade: Em 2001 foi feito na Bélgica um Musical baseado noTemplo do Sol)



ODE À NOITE

As flores selvagens escondem a sua idade debaixo da folhagem
eis a noite
o fogo esvai-se de pirilampo em pirilampo
negra é a noite
a lua passa a lua arrefece a lua apaga-se
fria é a noite
a águia poisa junto das outras na Cordilheira
longa é a noite
a serpente dorme na árvore morta que o tempo morde
morta é a noite
o rio rola que se desenrola e que arrulha
canta a noite
a noite protege o doce artifício das ternas armadilhas
louca é a noite
sobre todas as coisas a noite poisa e repousa
longa é a noite....


sexta-feira, 20 de novembro de 2009

LES DÉSESPÉRÉS

A grande qualidade dos textos de Brel está na verdade das palavras escritas. Está na realidade dos personagens intervenientes. Está na honestidade dos temas escolhidos. A propósito, Jacques Brel dizia que “um homem só é verdadeiramente honesto quando está a dormir... Mas, não se aprende nada vendo os outros dormir.” No texto que publico hoje, Les désespérés, Brel descreve o desespero do suicídio como forma de sarar as feridas profundas de um amor impossível.

OS DESESPERADOS (1965)

Eles caminham de mão dada, em silêncio, nessas cidades mortiças onde a morrinha oscila... Nada mais soa que os seus passos, passo a passo trauteados... Eles caminham em silêncio, os desesperados...

Eles queimaram as suas asas, perderam os seus ramos... De tal modo naufragados que até a morte lhes parece branca. Resgatados do amor, eles estão agora acordados e caminham em silêncio, os desesperados...

Eu conheço esse caminho porque já lá passei... Mais de cem vezes, mais de cem e a sua metade... Menos velhos ou mais magoados eles vão terminar o seu caminho e partir em silêncio, os desesperados...

E debaixo da ponte a água é serena e profunda... Aqui está uma amável hospedeira, aqui está o fim do mundo... Eles choram os seus nomes como os jovens casados e fundem-se no silêncio, os desesperados...

Que se levante aquele que lhes vai atirar a pedra, porque eles, do amor, apenas sabem o verbo amar... Sobre a ponte nada mais há que uma bruma ligeira, e logo se esquece, em silêncio, aqueles que esperaram...


quarta-feira, 18 de novembro de 2009

BREL ACTOR (3)


LES RISQUES DU MÉTIER
Realização: André Cayatte
Argumento : André Cayatte et Armand Jammot
Imagem: Christian Matras
Música: Jacques Brel et François Rauber
Montagem: Hélène Plewianikoff
Produção: Gaumont Internationale
Duração: 105 min. Estreado em: 21/12/1967
Com: Jacques Brel, Emmanuelle Riva, Jacques Harden, Nadine Alari, Christine Fabrega, René Dary, Muriel Baptiste, Delphine Deysieux.
Argumento
Jean Doucet é um professor de aldeia, casado e feliz no casamento e na profissão. Um dia é acusado de assédio sexual a uma aluna sua de 14 anos. A rapariga chegou a casa com o vestido rasgado e uma história de abusos do seu professor. A polícia é chamada a investigar, mas uma outra rapariga entra em cena também para o acusar de sedução. Ainda uma terceira rapariga faz o mesmo. O professor diz-se inocente mas a investigação está a arrasar a sua profissão, o seu casamento e a sua vida. O realizador André Cayatte baseou-se numa história verdadeira para, com a sua experiência de ex-advogado, denunciar injustiças sociais.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

LES PAUMÉS DU PETIT MATIN

"Les paumés du petit matin" é mais uma das grandes canções de Jacques Brel...
É o retrato nu e cru de um certo tipo de frequentadores da noite que vivem só para isso, para frequentar a noite. Na galeria de retratos que Brel foi fazendo ao longo da sua carreira estão também os desesperados, os frustrados, os tímidos, os pobres, os traídos. No entanto, a mensagem que está por detrás de cada um destes retratos resume-se a uma palavra… “ternura” . Todos temos necessidade de ternura. Brel renegará sempre a caridade como remédio para os seus retratados.

N.T. A melhor tradução para PAUMÉS DU PETIT MATIN nos anos 60 seria «os meninos bem das noitadas». Em 2009 não resisto a usar os BETINHOS DA NIGHT que exprime na perfeição o que Brel pretende dizer na canção.

OS BETINHOS DA NIGHT (1962)
Eles deitam-se à hora dos pastores, para se levantarem à hora do chá e depois saírem lá para as tantas... Os betinhos da night... Elas têm a arrogância das mulheres de peito feito... Eles têm aquela segurança dos homens onde se adivinha que o papá venceu na vida... Os betinhos da night...
Venham dançar... Venham dançar... Betinhos e betinhas... Venham dançar... E dancem com os olhos postos nos seios...
Eles branqueiam as noites no lavatório das melancolias, que lava sem sujar as mãos dos betinhos da night... E à meia-noite eles falam dos poemas que nunca leram, dos romances que não escreveram, dos amores que não tiveram, das verdades que não servem para nada... Os betinhos da night...
“Ah...o amor destrói-me o fígado”... Oh... Isto é bonito, é bonito... Vocês nunca mais compreenderiam os betinhos da night...
Eles tomam o último whisky, eles despedem-se pela última vez, eles tomam outro último whisky, eles atacam o último tango, eles agarram a última tristeza, os betinhos da night...
Venham chorar, betinhos... Venham... E chorem com os olhos postos nos seios... Vá lá... Venham chorar... Betinhos da night...


quarta-feira, 4 de novembro de 2009

BREL ACTOR (1)

L'EMMERDEUR (1973)
Realização: Edouard Molinaro
Argumento: Francis Weber da adaptação da sua peça "Le Contrat"
Imagem: Raoul Coutard
Música: Jacques Brel et François Rauber
Montagem: Robert et Monique Isnardon
Duração: 80 min. Estreia : 20/09/1973
Com: Jacques Brel, Lino Ventura, Caroline Cellier, Jean-Pierre Darras.

Argumento
Um assassino a soldo da Mafia, Ralph Milan, é encarregado de abater um tipo chamado Randoni, testemunha em vários processos que podem trazer graves problemas à organização.
Emboscado num quarto de hotel com janela virada para a porta do tribunal onde é esperado Randoni, o atirador espera pacientemente que a vítima passe pela frente da mira da sua espingarda com telescópio... Mas ele tem um vizinho no quarto ao lado, um certo senhor Pignon, tipo cordial, amigo do seu amigo, vendedor de gravatas, e que está a atravessar uma fase muito difícil da sua vida...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

ROSA

Ao ritmo de um tango, Jacques Brel ironiza sobre a classe média e as suas aspirações sociais. Na canção Rosa, os papás e os padres dos colégios internos esforçam-se por formar seres uniformizados todos com o mesmo objectivo na vida: Serem melhores que os progenitores mesmo que tenham de caminhar cegamente por atalhos desconhecidos. O personagem desta canção, no entanto, é um cábula que fura o esquema, e frequenta o colégio por causa da sua prima Rosa. O latim e as suas declinações não são com ele, visto que sabe que nunca poderá vir a ser um Vasco da Gama. A canção é de 1962.

ROSA

Rosa, rosa rosam...Rosae, rosae, rosa... Rosae, rosae, rosas... Rosarum rosis, rosis.... É o mais velho tango do mundo, aquele que as cabecinhas loiras balbuciam numa roda quando aprendem as lições de latim... É o tango do colégio que caça os sonhos numa rede, e depois é um sacrilégio se não se sair malicioso... É o tango dos anciãos, que vigiam com olhar severo os Júlios e os Prósperos, que serão a França de amanhã...

É o tango dos marrões, cheios de borbulhas e de agasalhos a cobrir o coração que já está frio... É o tango dos cábulas que declinam de desgosto e que serão farmacêuticos porque o papá não chegou a ser... É o tempo em que eu era o último, porque neste tango rosa rosae eu já me inclinava de preferência para a minha prima Rosa...

É o tango das passeatas, aos pares, sozinhos, debaixo das arcadas, cercados de padres e de alcaides, que nos protegiam dos porquês... É o tango da chuva no pátio, o espelho de um charco sem amor que me fez compreender um belo dia que eu nunca seria Vasco da Gama... Mas, é também o tango desse tempo bendito, onde por causa de um beijinho demasiado pequeno na clareira de um domingo, corou a minha prima Rosa...

É o tango daquele tempo em que eu tinha zeros, uns finos, outros grossos. Com eles fazia túneis para o Charlot e auréolas para S.Francisco... É o tango das recompensas que iam para aqueles que tinham a sorte de aprender, desde a infância, tudo aquilo que nunca lhes serviu para nada... Mas, é também o tango que nos faz lamentar, que por uma vez, o tempo se compra, e que nos apercebemos, estupidamente que a Rosa tem espinhos... Rosa, rosa rosam... Rosae, rosae, rosa... Rosae, rosae, rosa...Rosarum rosis, rosis...


ROSA na versão ao vivo...


ROSA na versão video clip...

domingo, 1 de novembro de 2009

LES REMPARTS DE VARSOVIE



Jacques Brel canta em público as suas canções pela última vez em 1967. Desiste dos palcos, com 38 anos de idade, porque não quer envelhecer artisticamente perante o seu público. O público reage mal a esta reforma antecipada do cantor. Ele dirá “que não é preciso exagerar, os artistas de variedades não são deuses”, e acrescenta que não passa “de um artesão, de um fabricante de canções”… A canção Les remparts de varsovie, pertence ao seu último disco gravado em 1977.

AS MURALHAS DE VARSÓVIA(1977)

A madame passeia o traseiro pelas muralhas de Varsóvia... A madame passeia o coração pelos trastes da sua leviandade... A madame passeia a sua sombra pelas grandes praças de Itália... Eu acho que a madame vive a sua vida! A madame passeia de madrugada os sinais das suas insónias... Passeia a cavalo os seus estado de alma e os seus caprichos... Passeia um imbecil que jura que a madame é linda... Eu acho que a madame está bem servida!
Ao passo que eu, todas as noites, sou porteiro no Alcazar...

A madame passeia o Verão até ao Sul da França... A madame passeia os seios até ao Sul do acaso... Passeia a depressão ao longo do lago de Constance... Eu acho que a madame é de circunstância!
A madame passeia o seu Lulu, um salsicha negro, chamado Bizâncio... A madame arrasta a sua infância, que altera conforme as ocasiões... A madame passeia por todo o lado o seu sotaque russo, com facilidade... A verdade é que a madame é de Valence...
Ao passo que eu, todas as noites, sou barman no Alcazar...

A madame passeia os cabelos que têm um perfume de “Noites da China”... A madame passeia o olhar sobre todos os velhos industriais... Passeia o seu sorriso, como outros passeiam a sua brilhantina.... Eu acho que a madame é uma libertina! A madame passeia as suas bebedeiras de copo em copo, de taça em taça... Passeia os genes de vinte mil oficiais de Marinha... A madame diz por todo o lado que é conhecida por Titi Jacqueline... Eu acho que a madame é uma má companhia!
Ao passo que eu, todas as noites, sou cantora ligeira no Alcazar...

A madame passeia as mãos pelos diferentes ramos das forças armadas... Passeia os meus tostões pelos novos ricos do bairro da lata... A madame passeia-se de coche e gostava que fosse eu a puxá-lo... Eu acho que a madame é uma vaidosa... A madame passeia o pé de meia que ela gostava que fosse eu a administrar... A madame passeia as jóias que ela gostava que fosse eu a pagar... A madame passeia no meu Rolls e persegue alguns meirinhos... Eu acho que a madame está é com pressa...
Ao passo que eu, todas as noites, lavo a loiça no Alcazar!


Versão de FLORENT PAGNY